sexta-feira, 7 de maio de 2010

Crocodilo que não bate, apanha!

Não dá pra dizer que é lenda, mas há uma crença arraigada na cultura desse povo que considero pra lá de interessante…

Na última quinta-feira quando voltávamos do trabalho, ao passarmos pela ponte vivemos um momento muito inusitado e cheio de perplexidade.

Tudo o que a gente mais quer quando está voltando do trabalho é pegar a ponte aberta para chegar logo no hotel, depois de um longo e cansativo dia de trabalho, muitas vezes acompanhado de um calorão de dar gotas…

No meio do caminho e de olho no relógio já começamos a fazer as contas, observar o trânsito, porque, carros vindo no sentido contrário ao nosso, quanto mais perto da ponte são mal sinal, principalmente se for próximo de hora cheia – sinal de que a ponte acaba de abrir para o outro lado… Aos poucos vamos ficando cheios de manhas e desenvolvemos “altas” teorias para tentar explicar o inexplicável caos urbano decorrente de um trânsito desorganizado e uma super ponte em interminável reforma.

Neste dia, como ainda era véspera de um feriado prolongado para nós – estávamos na véspera do dia não trabalhado para compras e do feriado de 1º de Maio – a adrenalina estava alta e já vivíamos a ansiedade do passeio que faríamos em Songo. Bom, ninguém dormia, falávamos bastante, depois, aquietamos um pouco e cada um foi fazer alguma coisa para matar o tempo. Fernanda assistia Felicity, Apolinário tentava vez atrás da outra falar no Brasil no que se configurava uma cena de comédia para quem o ouvia o tempo todo num eterno Alô! Alô! Oi meu filho, tá me ouvindo? Alô? O sinal está muito ruim aqui… Após silencio fúnebre ele recomeçava determinado, porém, do começo: Alô! Alô! Oi meu filho, tá me ouvindo? Alô? O sinal está muito ruim aqui… E outro silêncio… e tudo de novo do mesmo lugar. Pelo menos se ele começasse mais adiante, talvez tivesse a sorte de falar umas palavrinhas diferentes, coitado, rs… Parecia chamada de 3 segundos, dessas que fazem no Brasil quando acabam os créditos, (risos)….

Fomos nessa batida até que nos aproximamos da ponte. Eu suspirei que desejava apenas um final de semana no Brasil para matar as saudades, Polina, disse logo que era bobagem porque teria que voltar e Fernanda emendou de placa, com sonoplastia impecável, seu desejo de uma “idinha” pra lá de estratégica ao Brasil com fins específicos e tão específicos que chega a ser “tarja preta” a publicação neste veículo quase beato de comunicação. Sei que foi um momento tão engraçado, ainda mais vindo da Fernanda, que caímos na risada, e, o Apolinário, quase da poltrona do nosso confortabilíssimo machimbombo!

Quando pensamos que faltava só romper a cancela da ponte - aberta… Avistamos bem na beirinha da entrada da ponte um grupo de meninos rodeando, e, literalmente enchendo de pancadas, um filhote de crocodilo. Gente, para mim, foi uma das cenas mais marcantes desde que cheguei em Tete. Os meninos gritavam e acenavam, chutavam o pobre coitado do crocodilinho, exibiam a cria como se fosse um troféu. E o pobre lá, inerte, impassivo, um verdadeiro coitado! A esta altura já estava mais do que morto mas a cena ainda impressionava bastante. Pena que, eu, podem vaiar, câmera na bolsa, não consegui sacar a tempo para registrar o “encontro”, mesmo porque, nossos pedidos haviam sido atendidos e todo meu relato se deu com o machimbombo em movimento porque a ponte estava aberta! Oh céus, como desejei, apenas naquele dia, que ela estivesse fechada! Apenas tempo suficiente para descermos, ou da janela mesmo tirarmos fotos para compartilharmos com vcs e imortalizarmos o momento, que, minutos depois, viemos saber por colega a mais tempo na cidade, tratava-se de um ritual comum.

É o seguinte;

Na crença popular regional e tradicional, cada crocodilo tem um dono. Isso mesmo. O crocodilo só pega alguém a mando do seu dono. Ou ainda, o dono se incorpora no crocodilo e vai ate o seu desafeto atacando-o. De modo que não é boa ideia manter desafetos por estas terras, concordam? Bom, diz a tradição ainda, que as pessoas procuram os tradicionais curandeiros em busca de fechar o corpo e pedir proteção para os ataques dos inimigos. Longe de mim brincar com coisa séria, mas é meio lobo, só que em pele de crocodilo, entende?

Daí, quando o feitiço se vira contra o feiticeiro e pegam o crocodilo antes que ele os pegue, descem-lhe o cacete, descarregando no pobre a raiva do inimigo imaginário ou não. Isso torna menos revoltante a cena de ver um animal irracional até simpatiquinho apanhar tanto e impunemente. Contaram-nos ainda que é comum algumas pessoas interferirem e soltarem o coitado, mas isso não se deu desta vez e o crocodilinho apanhou até morrer… Também era apenas um filhote. Fosse um criado como vimos nos dias seguintes em Songo, duvido que alguém se atreveria dar com os pés nele!

Posto a seguir, perdoem-me a qualidade, uma fotoca gentilmente cedida pela Lúcia, muito mais esperta do que eu, passou na hora com o celular em punho e registrou, pelo menos o crocodilinho. Fico devendo a foto da cena, com os meninos em volta, mas se algum dia conseguir, posto na hora!

Beijos!