terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Segunda-feira ... Dia de cão!

A festança do Motinha deixou lembranças…

Morar sozinha nunca foi novidade para mim, mas confesso que nunca fui exemplar nisso. Desde os 14 anos quando saí de casa passei temporadas sozinha, fosse num quarto de alojamento, fosse em repúblicas cujos colegas exercitavam turnos diferentes dos meus, por vezes a mais exótica, mantendo jornadas das 0 as 6h e dormindo nos intervalos do cursinho e segundo emprego. Independente de qual fosse a situação, a hora de comer sozinha nunca me inspirara grandes prazeres. E olha que sou uma boa gourmé, venho de família com descendência italiana e como tal, famosa pelo respeito ao garfo. Adoro mesa farta, amigos reunidos, panela cheia e gente satisfeita no melhor estilo “antes sobrar do que faltar”, mas, quando estou morando sozinha, o feitiço vira contra o feiticeiro e a minha geladeira fica parecendo um coco (cheia de água) – os armários parecem expedição de fábrica de macarrão e a vida alimentar corre meio “sem graça”. Falta inspiração, ânimo, coragem mesmo…

Sem contar que me fazer cozinhar pouquinho é quase um castigo e comer a semana toda o mesmo prato em função da minha pouca educação ao dosar as comidas é o segundo sacrilégio. Descontos sejam permitidos, até bem pouco tempo atrás eu pesava quase mais uma de mim hoje, e, como o inconsciente levou bons anos vivendo assim, nessa deseducação toda, retrair-me aos educados modos de quem come bem menos hoje não é nada fácil.

Dia anterior, festa do Motinha. Bebi pouco e quase não comi. Durante o dia, por duas vezes belisquei restos de uma pizza que sobrara do jantar, bem ao estilo americano, que leva pra casa o take away gorduroso do lanche da noite para comer no café. Era resto de pizza, preguiça de cozinhar só para mim e em resumo, retrato da minha má alimentação desde que retornei a Tete, pelo menos em casa.

Perdi um pouco o tesão pela cozinha.

Antes disso porém, na minha ausência, Tete recebeu sobre a cabeça chuvas consideráveis e com sua pouca estrutura sofreu panes elétricas gerais, o que é péssimo – tudo o que é geral aqui vira motivo de desculpa para não se ter solução de curto prazo. Resultado: Minha casa, das menos afetadas por obra do Pai, teve o microondas e o ar da sala queimados, o ar do quarto afetado, a geladeira prejudicada, a internet, que nunca foi boa, “regaçada”, e, para me dar motivos de achar tudo isso o suficiente para agradecer, a notícia de que só não pegou fogo porque Deus intercedeu e de que vizinhos tiveram resultados muito piores. Ou seja, estou sem internet desde que cheguei, perdi 10 ou mais quilos de carne e outros alimentos, fiquei alguns dias sem ares – só consertados pela inestimável presteza de profissionais amigos prontos a ajudar e a casa continua funcionando igual refrigerador de frigorífico, num arma e desarma sem fim – variando de fases de corrente elétrica, que me indica o mau sinal de que a qualquer hora pifarão mais coisas. Eitalelê!

Daí a pizza, comprada no La Bella, irmão caçula do Bela Itália, fechado no final do ano no centro de Tete e reaberto de cara nova e mesmo cardápio, em Matema, bairro da periferia central com enorme potencial residencial em alguns anos, porém, do lado de lá da ponte, no caminho para Moatize. Sob o preço de 30 minutos a mais na fila da ponte e muitas picadas de mosquitos famintos, sentamos na última sexta-feira numa das mesinhas para degustar a bela pizza e pratos de massas. Como cada um queria uma coisa diferente, comi um ou dois pedaços da minha mexicana e pedi para embalarem o resto, já pensando no almoço do dia seguinte!

No Sábado, pré-festa, aqueci no forno a gás o meu restinho, almocei e jantei. Na festa, quase não comi – belisquei uma ou duas vezes o patezinho com pão, nada mais. Bebi também de leve e voltei para casa, já com uma sensação esquisita… No dia seguinte, tentamos uma churrascada com as carnes que sobraram mas acabamos almoçando arroz com vinagrete, as coitadas morreram no lixo – essa história de congela na alta e descongela na falta de energia não presta!

A coisa só piorou e pude sentir o que sentem as flores, os reis e rainhas… Fiquei de castigo no vaso, no trono... Dormi um pouquinho e com a sensação de “boi no estômago”, acordei a 1:30 da manhã desejando a morte, menos aquela dor toda. Meu Deus, como é horrível estar sozinho nestas horas – eu mal conseguia respirar, muito menos pensar no que fazer. Rezava para ver se o Alto dava uma mãozinha mas nada ou ninguém me parecia suficientemente acordado para me erguer uma corda. Eu mesma iria ter que olhar por mim. Abri a gaveta de remédios e tomei tudo o que lembrara funcionar noutras épocas, em situações semelhantes – passar mal nessa terra só é novidade para calouros e eu já passei desta fase. Que alegria encontrar um vidrinho de Luftal, Floratil e até mesmo Omeprazol quando a vida lhe fecha as portas assim. Enchi a cara de drogas, agarrei-me de novo ao supremo para esperar os efeitos e torci para não ter que acordar ninguém àquela hora. E assim fui entre cólicas, espasmos e pontapés estomacais até o raiar do dia, onde, sem energia, caí em repouso.

Ainda dolorida e sem entender se foi o resto da pizza ou uma mini salmonela bombada qualquer escondida num ou noutro alimento, continuo com a sensação de ter perdido a briga com Arcelino “Popó” de Freitas ao levar um jeb de esquerda ou direita na “boca do estômago”. Seja lá o que for, quebrou a minha ideia de que os dias de rainha em Tete tinham terminado quando a minha flora intestinal deu sinais de ter conseguido cidadania moçambicana. Nada disso. Tal como os anti vírus, os bichinhos que atacam os intestinos e estômagos das pessoas estão sempre se renovando e buscando novas formas de sobreviver, salve-se quem puder!

Sem perder o humor, entretanto, lembrando que é preciso tirar proveito até do que não presta, e, remontando às épocas de república em que a geladeira tinha alimentos diversos de 4, 5 pessoas e uma delas, minha querida amiga Raquel, sempre deixava os seus criando fungos tal como nas experiências de escola, e, se interpelada por nós, dizia que nenhum mal havia numa diarréia, pelo contrário, boa receita para perder uns quilinhos, cá estou eu, duas olheiras a mais e quilinhos a menos - que mal há?!

Beijos, Anna