quarta-feira, 9 de junho de 2010

Inverno rigoroso em Tete - Uma conversa de elevador.

Era Domingo.

Acordei meio ressaqueada depois de umas Vodkas e cervejas no Sábado.
Nada demais para quem quase não tem bebido desde que chegou.

Confesso que antes de vir andei pensando que a chance de me tornar ainda mais boca de gole era grande num lugar em que há pouca opção de tudo, o que faz da cachaçada, sempre a melhor opção.

Mas não foi bem isso o que aconteceu e ando até bem comportada - já houve dias em que posei com garrafa de cerveja na foto, mas não bebi. Já fiquei de água mineral e coca cola muitas e muitas vezes e nem por isso mais ou menos feliz.

Bom, sem querer me desculpar pelo acontecido, o Sábado foi muito é bom. E tomei umas a mais mesmo, mas me diverti bastante cozinhando uma costelinha com canjiquinha na casa de amigos aqui. Certa hora a cerveja acabou e apareceu um litro de Vodka em nossa frente. Uma batidinha no liquidificador, gelo, pronto. Deu que a luz acabou, perdemos o controle do quanto caía no copo e o suquinho do mal me rendeu uma ressaca ajeitada no domingo.

Mas o mais engraçado da coisa nem foi isso.

Acordei super cedo com o gerador armando no meu ouvido. Sou vizinha do gerador aqui do Hotel, e, gente, que sujeito mal educado. Tudo bem que ele se arma para o nosso conforto, mas faz um barulho tão grande que vira o meu vento.

Bom, no auge da resaca pensei: Tomar o café da manhã vai ser bom, pelo menos o estômago cheio tapeia o organismo e expurga o que restar desse álcool maldito dentro de mim.

Tomei um banho, troquei a roupa e peguei o elevador, que, genioso, desceu ao invés de subir - ele sempre faz isso quando quer.

Lá embaixo um funcionário do hotel, um senhor, encapotado até a alma num domingo de sol, abre a porta esperando que eu saia, mas tudo o que eu queria era chegar ao 5º andar e comer um daqueles omeletinhos sempre presentes no matabicho de domingo.

Não vai descer? Disse-me ele sorrindo. Não senhor, vou ao 5º andar. E, simpático disparou: Tudo bem? Sim, e o senhor. Bem "brigad", como é típico de um moçambicano que se preze.

Não contente, perguntou de novo. Dormiu bem? Sim senhor. E ele, pelo visto sem ressaca, continuou firme enquanto a carroça do elevador subia lentamente os andares que faltavam para o restaurante.

Ah... Mas está muito fresco (referindo-se a frio), não? Eu, de short e camiseta de malha, ardendo em Vodka não concordei, nem discordei... Apenas devolvi. O senhor acha mesmo que está frio? Consciente do que sentia foi rápido e rasteiro: Nossa, estamos vivendo um inverno rigoroso em Tete!!!

O elevador parou no 3º, ele desceu e abanou a cabeça se despedindo, antes mesmo de eu processar o peso que ele dera ao que chamou de "inverno rigoroso".

Apenas a título de informação, a temperatura tem variado dos 26ºC durante o dia - às vezes pouco mais, até congelantes 19ºC a noite, tá?!

Contra os 44, 46ºC habituais no verão, até que Tete anda fresca demais mesmo...

Inverno rigoroso em Tete, um papo de elevador que mais parece conversa de pescador!


Cenas de um entardecer na estrada Moatize - Tete
num desses dias de inverno rigoroso.

Falta de água no meu quarto.

Eu que atravessei o Atlântico para aprender que paciência a gente exercita, dia após dia, tenho tentado aprender de verdade essa virtude que já considero uma arte.

Tudo aqui testa os nervos da gente, ainda mais levando em conta todos os outros sentimentos e situações que precisamos administrar, cada dia é uma escalada.

O Hotel é sem dúvida o melhor da cidade, mas isso não faz dele uma Brastemp, pra falar a verdade bem menos. E viver no Hotel é uma das lições desse aprendizado. Cada dia é uma nova emoção.

Quando chegamos, ansiávamos pelo dia em que trocariam as roupas de cama, daí, quando trocaram, melhor que tivéssemos ficado com as anteriores - pelo menos tinham o nosso cheiro, rs... Os lençóis amarelados deixavam bem "claro" que a coisa não cheirava a casa da gente.

E assim levamos, cada dia uma surpresinha - Ora esquecem de colocar o papelo higiênico, ora somem com o copo, ora o travesseiro aparece sem fronha, ora falta toalha, quase toda hora a internet não funciona e agora deu para faltar água.

Ah, não! Sem água não!

Sexta passada esperei por quase uma hora a pirraça da água com a torneira até que consegui um banho modesto, longe, muuuuito longe de um desses deliciosos banhos que tomamos no Brasil. A água aqui é muito diferente, estranha, meio impura, deixa a pele super ressecada e o cabelo então, que beleza!

Sei que a briga da água com a torneira foi me irritando e irritando, até que na segunda a noite cheguei cansada, doida por um banho digno de alguém que ralou o dia todo e nada além de um caldo grosso e laranja me saudou na boca da torneira escorrendo pela capa branca da banheira.

Esqueci todas as lições anteriores e zarpei feito flecha até a recepção, onde, apáticos, conversavam três recepcionistas.

Senhores, boa noite!
Estou sem uma gora de água em meu quarto, podem me ajudar?

Entreolharam-se de um jeito que merecia uma filmagem - Eu queria ser um dos neurônios deles para contar exatamente para vocês o que pensaram, mas o rosto deixava parecer algo do tipo - Ih! Fudeu!

Segundos se passaram e aquele olhar congelado explodiu na reação de um deles, que me pareceu ser o gerente daquela reunião de mesma patente. Fulano, vá procurar o Cicrano! Ele ainda está aí. E o fulano, com olhar esbugalhado levou ainda uns 10 segundos e precisou de um zangado . vá, fulano! para aí sim sair da posição de "estátua" e sair pelo corredor. Eu, que pouco adiantaria ficar marcando cerrado naquele momento, falei mais meia dúzia de palavras tentando expressar que aquilo não podia condizer com um bom serviço e avisei que estaria no quarto esperando pela solução.

Quase 20 minutos depois me apareceu um rapaz de uniforme azul escuro e nome tão complicado que não fixei, com uma chave de boca na mão daquelas de desenroscar peças do gerador, meu vizinho. Bom, a mim pouca diferença fazia que ele deixasse sobrar peças, queria água para banho!

Deu duas desenroscadas no bocal da torneira que libera água para a banheira e chuveiro e ploft... Toda a água do mundo represada aos poucos, desde sexta-feira, saiu como cachoeira banheira abaixo, não sem antes liberar o que a impedia, quilos de areia. Areia mesmo, meio calhau, parecendo brocal, daqueles que usamos no carnaval - ou usávamos quando eu era criança, rs,... ontem mesmo!

Gente! Imagina a minha cara, pensando quanta areia já recebi no corpo e cabelos nos últimos sessenta e poucos dias?

Perguntei passada o que era o problema,  areia?
Chupando o bocal como a um chup chup e cuspindo para o ar o que sobrava daquela porcaria toda - imaginem minha cara de satisfação - o mecânico especializado em libertar a areia do encanamento, respondeu sorrindo sem muita graça. Aham...

Agradeci e ri sozinha...

Fazer o quê, vou matar?
Tem que inducar!!!!

A água do chuveiro estava tão afoita por aquela liberdade toda no cano que chega a machucar quando bate no corpo, rs... Da próxima vez vou pedir ao "Gajo" pra tirar só a metade, hehehe!!!